CLUBE DOS POETAS MORTOS
MANUEL CINTRA
Com uma vida dedicada às artes, à poesia (e à sua divulgação), ao teatro, à tradução, à música, à interpretação, Manuel Cintra nasce em Lisboa, em 1956. As suas palavras são íntegras, intensas, platónicas. Um poeta e, ainda além, artista, cuja obra se manterá refém da memória. Manuel Cintra despede-se de nós a 4 de junho de 2020. Do seu Facebook, onde partilhava os seus versos, retiramos o seguinte poema:
PRESTES A CAIR
Há coisas que não perdem valor.
São poucas, mas parece que existem.
As pétalas de uma rosa que não se chegou a oferecer.
Mas que tinha destino. As pétalas foram-se,
mas o que ficou é precioso. Não tem nome.
Quase não existe. É essa substância ínfima
que nos sustenta perto de um galho prestes a cair.
Rumo ao infinito. Como a vida.
Há amarguras que um dia ficam doces.
Ninguém fez nada, ninguém sabe porquê.
Uma pálpebra moveu-se. Um dedo, no escuro, vibrou
a nota certa.
E solta-se uma explosão de lágrimas.
Retidas durante anos, até extinguir a seca.
O voo acaba ali. Algo fica mais leve.
Algo não morre.
Manuel Cintra
12 de outubro de 2019
19h18.
DILÚVIO
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