
CLUBE DOS POETAS MORTOS
MANUEL ANTÓNIO PINA
Escreveu poesia, literatura infanto-juvenil, ensaios, novelas, textos dramáticos; deixou-nos obras como Histórias com Pés e Cabeça, Aquele Que Quer Morrer, Um Sítio Onde Pousar a Cabeça ou Como se Desenha uma Casa, onde o poema escolhido para representar a sua efeméride está publicado. Manuel António Pina foi um prolífico autor português, hábil nas palavras e com uma singular voz poética, criativa, vincada. Ainda hoje as suas peças de teatro são encenadas por todo o país. Foi traduzido por toda a Europa e nos Estados Unidos, sendo-lhe atribuído, em 2011, o Prémio Camões. Faleceu a 19 de outubro de 2012.
COMO SE DESENHA UMA CASA
Primeiro abre-se a porta
por dentro sobre a tela imatura onde previamente
se escreveram palavras antigas: o cão, o jardim impresente,
a mãe para sempre morta.
Anoiteceu, apagamos a luz e, depois,
como uma foto que se guarda na carteira,
iluminam-se no quintal as flores da macieira
e, no papel de parede, agitam-se as recordações.
Protege-te delas, das recordações,
dos seus ócios, das suas conspirações;
usa cores morosas, tons mais-que-perfeitos:
o rosa para as lágrimas, o azul para os sonhos desfeitos.
Uma casa é as ruínas de uma casa,
uma coisa ameaçadora à espera de uma palavra;
desenha-a como quem embala um remorso,
com algum grau de abstracção e sem um plano rigoroso.
DILÚVIO
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