
CECÍLIA MEIRELES
Nasce em 1901 e depressa se torna órfã. Criada pela avó, desde nova, como a própria disse, íntima da Morte, conhecedora das “relações entre o Efémero e o Eterno”, Cecília Meireles tomou os temas do abandono e da solidão na sua poesia e ainda hoje o seu lirismo é tido como um dos mais fluídos e musicais da poesia em língua portuguesa. Foi professora e jornalista, tendo começado a publicar poesia aos 18 anos. Mais tarde, cria, com o marido, o pintor Fernando Dias, o Centro de Cultura Infantil, censurado, anos depois, por Getúlio Vargas, a quem veemente Cecília se opunha. Com uma obra extensa e diversa, faleceu, vítima de cancro, em 1964, recebendo, em 65, o Prémio Machado de Assis.
RUA DOS ROSTOS PERDIDOS
Este vento não leva apenas os chapéus,
estas plumas, estas sedas:
este vento leva todos os rostos,
muito mais depressa.
Nossas vozes já estao longe,
e como se pode conversar,
como podem conversar estes passantes
decapitados pelo vento?
Não, não podemos segurar o nosso rosto:
as mãos encontram o ar,
a sucessão das datas,
a sombra das fugas, impalpável.
Quando voltares por aqui,
saberás que teus olhos
não se fundiram em lagrimas, não,
mas em tempo.
De muito longe avisto a nossa passagem
nesta rua, nesta tarde, neste outono,
nesta cidade, neste mundo, neste dia.
(Não leias o nome da rua, – não leias!)
Conta as tuas histórias de amor
como quem estivesse gravando,
vagaroso, um fiel diamante.
E tudo fosse eterno e imóvel.
Poesia Completa, Viagem (1939)
DILÚVIO
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